segunda-feira, 15 de julho de 2013

COMO ERA PARIS NO SÉCULO XIV


UMA DESCRIÇÃO DA CIDADE DE PARIS NO SÉCULO XIV



Ile de La Cité - Paris

A cidade que Marcel (Etienne Marcel – Preboste dos Comerciantes, que correspondia à função de prefeito da cidade) governava cobria uma área que, em sua disposição atual ia desde os Grand Boulevards, na margem direita (do rio Sena), até o Jardim de Luxemburgo, na margem esquerda, e de leste para oeste estendia-se da Bastilha às Tulherias. Tudo que ficava além desses limites era faubourg, ou campo. O centro de Paris era a Ile de La Cité, no meio do Sena, na qual ficavam a catedral de Notre-Dame, o Hotel Dieu ou Hospital público, e o palácio real construído por São Luis (Luis IX, Rei de França – 1214-1270). A margem direita, que se estendera além das velhas muralhas, era o local do comércio, da indústria, dos mercados públicos, do comércio de luxo e das residências opulentas, ao passo que a margem esquerda, muito menor em área povoada, era dominada pela universidade. De acordo com um levantamento fiscal do ano de 1292, a cidade tinha, na época, 352 ruas, 11 ruas transversais, dez praças, 15 igrejas e 15 mil contribuintes. Cinquenta anos depois, na época de Marcel, sua população total, depois da Peste Negra, era provavelmente de cerca de 75 mil habitantes.
As principais ruas eram pavimentadas (com pedras) e bastante largas para a passagem de duas carroças ou carruagens, enquanto as outras eram estreitas, lamacentas e malcheirosas, com um esgoto correndo no meio. A rua era o local onde o cidadão médio lançava todos os detritos e dejetos, e nos bairros pobres havia, em geral, um monte de lixo em cada porta. Os moradores deveriam levar os depósitos de dejetos para poços próprios e eram lembrados, por repetidas determinações municipais, que tinham que pavimentar e varrer a entrada de suas casas.
O congestionamento do tráfego bloqueava as ruas estreitas quando tropas de burros, com cestos de ambos os lados, se encontravam com vendedores com suas bandejas, ou carregadores curvados sob feixes de lenha e sacos de carvão. Tabuleiros de tavernas (bares) presas a compridos postes de ferro aumentavam ainda mais o congestionamento. As tabuletas das lojas eram enormes, para atrair a atenção dos fregueses, pois os lojistas estavam proibidos de chamá-los enquanto estivessem na loja vizinha. Um dentista era representado por um dente do tamanhp de uma cadeira; o luveiro, por uma luva com dedos suficientemente grandes para conter uma criança.
O barulho das tabuletas agitadas ao vento competia com os gritos dos vendedores de rua, dos condutores de burros, o tropel dos cavalos e as comunicações dos pregoeiros públicos. (…) Os pregoeiros anunciavam, duas vezes ao dia, decretos oficiais, casas à venda, casamentos, novos impostos, crianças desaparecidas, funerais, nascimentos e batismos.
Cada ramo de comércio tinha sua própria rua – açougueiros e curtidores em volta do Châtelet, cambistas, ourives e negociantes de tecidos na Grand Pont, escribas e ilustradores de livros e vendedores de pergaminhos e tintas na margem esquerda, junto da universidade. Havia ainda lojas ao ar livre de chapeleiros, marceneiros, ceramistas, barbeiros, ferreiros, farmacêuticos, lavadores e peixeiros.
Em todos os bairros havia banhos públicos, tanto de vapor quanto de água quente. No início do século XIV, eram 26 os estabelecimentos desse tipo na cidade. Embora considerados uma ameaça para a moral, especialmente das mulheres, eram vistos como uma contribuição para a limpeza e a cidade se empenhava para mantê-los abertos, especialmente no inverno, quando o combustível encarecia. Não podiam admitir prostitutas, leprosos, homens de má reputação, vagabundos e não podiam abrir antes do amanhecer, já que à noite as ruas eram muito perigosas.
A água era fornecida à cidade por fontes públicas. Alimentadas por aquedutos que vinham de fora da cidade. Frutas, verduras e outros alimentos vinham especialmente de barco pelo rio, a partir dos faubourgs, a área rural.
Durante o dia, além do movimento do comércio, mendigos pediam esmola à porta das igrejas, monges mendicantes imploravam pão para suas ordens, mágicos e artistas estavam em toda parte, e contadores de histórias recitavam aventuras, especialmente dos combates em terras sarracenas (árabes)
(…) Aos domingos todos os negocios fechavam, o povo ia à igreja e, em seguida, os trabalhadores reuniam-se em tavernas, enquanto os burgueses passavam nos faubourgs.
As casas, em geral, eram modestamente mobliadas, mesmo em residências nobres. Havia poucas cadeiras e, geralmente, as camas serviam tanto para sentar quanto para dormir. As camas eram cobertas por cortinas, colchas decoradas e tapeçarias, nas casas nobres, ou por peles de animais, nas casas mais modestas, uma vez que eram mais baratas do que a lã.
O aquecimento era feito por lareiras embutidas nas paredes ou por fogões e caçarolas com brasas nas casas mais simples. A iluminação ficava por conta de tochas colocadas do lado de fora das casas, fixadas em muros e paredes externas, próximas às janelas.
Havia também poucos quartos, as pessoas dormiam juntas, inclusive os visitantes. Não havia privacidade. Os criados dormiam em qualquer lugar, em qualquer canto enrolados em suas peles.
O chão era coberto por palha e ervas aromáticas para encobrir o mal cheiro (os mais ricos espalhavam flores), especialmente no verão. Ficavam repletos de excrementos de animais, pulgas e outros insetos. Eram trocados quatro vezes por ano, ou uma vez por ano, nas casas mais pobres.
Ao anoitecer, o sino dava o toque de recolher, anunciando a hora do fechamento, o trabalho cessava, as lojas eram fechadas, o silêncio substituia a agitação. Às oito horas a cidade ficava às escuras. Apenas as esquinas eram iluminadas por velas ou lâmpadas a òleo colocadas em nichos de Nossa Senhora ou do Santo Padroeiro do bairro. Ninguém ousava sair à noite.
As ruas não tinham nome, de modo que as pessoas eram obrigadas a procurar durante horas para encontarar o lugar desejado


Texto Adaptado de: “Um Espelho Distante: O Terrível Século XIV” - de Bárbara W. Tuchman

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