domingo, 6 de maio de 2012

SANTOS DUMONT: ELE NÃO INVENTOU O AVIÃO NEM O RELÓGIO DE PULSO

SANTOS DUMONT – ELE NÃO INVENTOU O AVIÃO NEM O RELÓGIO DE PULSO
Adaptado de : Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil
Leandro Narloch


O aviador mineiro Alberto Santos Dumont foi uma grande figura. Filho de um dos maiores cafeicultores do mundo, amigo de magnatas e princesas e provavelmente gay, era uma estrela dos cafés e bulevares de Paris durante a Belle Époque. Nos anos de paz, otimismo e inovação que alegraram a França no começo do século XX, enquanto os irmãos Lumière inventavam o cinema e os expressionistas inovavam a pintura, Santos Dumont encantava a capital do mundo com seus balões, Provou que as estruturas movidas a hidrogênio ou ar quente poderiam ser dirigíveis e tornou propriedade pública o direito de alguns de seus inventos, permitindo que qualquer pessoa copiasse os projetos de graça. Infelizmente, entre as conquistas do brasileiro não se inclui a descoberta do avião. Na verdade, é um pouco infantil insistirmos que Santos Dumont inventou o avião. O crédito dessa descoberta é obviamente dos irmãos Orville e Wilbur Wright. Os dois fabricantes de bicicletas nos EUA voaram antes, voaram mais e contribuíram muito mais para a indústria aeronáutica que o inventor brasileiro.
Os patriotas que defendem Santos Dumont como o grande pioneiro da aviação costumam se basear em dois argumentos principais:
1. O argumento do registro oficial
Santos Dumont foi o primeiro homem a registrar um voo controlável com um objeto mais pesado que o ar (e não um balão de ar quente). Essa façanha ocorreu no dia 12 de novembro de 1906, no campo de Bagatelle, arredores de Paris. A bordo do 14 BIS, ele voou uma distância de 220 metros. Apesar de ter atingido uma altura máxima de 6 metros conquistou um prêmio de 1500 francos do Aeroclube Francês, destinado a quem conseguisse voar por mais de 100 metros de distância. Já os irmãos americanos Orville e Wilbur Wright e outros pioneiros, que afirmam ter voado antes de 1906, não registraram o feito nem o comprovaram em público como fez o brasileiro.
2. O argumento do estilingue
Os aviões dos Wright não saiam do chão usando força própria. Uma catapulta os impulsionava no momento da decolagem, que também era facilitada por uma linha de trilhos em declive. Como o comitê francês que premiou Santos Dumont proibia forças externas empurrando os aparelhos, a façanha dos Wright é inválida. Já o 14-BIS realizou um voo autônomo, impulsionado por um motor próprio.
Veja a seguir, cinco razões para não acreditar nesses dois argumentos.

Enquanto os irmãos Wright inventavam o avião, Santos Dumont construía balões


Flyer I - foto de original de 1903


(...) Era dezembro de 1903. Das 10h35 até o meio-dia, os irmãos Wright fazem pequenos voos (de 36, 53, 61 e 260 metros) numa praia de Kitty Hawk, Carolina do Norte, EUA. O Museu do Ar e do Espaço, da França, e a Associação Aeronáutica Internacional reconhecem o episódio como a primeira vez que o homem saiu do chão com uma máquina dirigível mais pesada que o ar. O Flyer I usa correntes de bicicleta, madeiras de construir casas e, exatamente como os aviões do futuro, hélices, um motor a gasolina e asas levemente curvas. O garoto Johnny Moore, o salva-vidas John Daniels e mais duas pessoas testemunharam o fato; uma foto o registra.
(...) Na mesma época, Santos Dumont mal imagina que pode sair do chão com um aparelho desprovido de bolsas de ar quente. Os balões lhe rendiam fama mundial desde 1901, quando, a bordo de um modelo alongado, com hélice e um leme, conseguiu dar uma volta na Torre Eiffel. Em 1903, o brasileiro não quer abandonar os balões, pelo contrário. Acha que eles são o futuro dos transportes urbanos.

Há, sim, provas e testemunhas dos voos dos irmãos Wright

É verdade que não houve registro oficial do voo dos americanos, sobretudo porque não existia, nos EUA, prêmios e concursos para pioneiros iguais aos que havia na França. Também porque estavam mais preocupados em ganhar dinheiro com a fabricação de seu projeto do que conquistar prêmios e notícias adulatórias nos jornais. Quando alguém perguntava porque não faziam voos públicos, os dois diziam: “Não somos artistas de circo”.
Além da discrição os Wright pensavam que, se alguém patenteasse o avião antes deles, todo o esforço em construir as estruturas e testá-las iria pelos ares. Temiam que o projeto fosse copiado. (...) Preferiam ter certeza de que haviam inventado o avião antes de divulgar a descoberta.
A certeza chegou em 1904, quando os Wright somaram 45 minutos de voo. Estavam tão seguros do pioneirismo que resolveram chamar a imprensa. Voos desse ano e do seguinte foram testemunhados por viajantes, empresários e repórteres. Em outubro de 1905, os dois mandaram trinta convites para que testemunhas de credibilidade os assistissem. E elas se deslumbraram. No dia 05 de outubro, Wilbur Wright voou com o Flyer III durante 39 minutos, percorrendo 38,9 quilômetros. Bateu o recorde de distância e fez os primeiros voos circulares, dando trinta voltas no campo de testes. Cerca de sessenta pessoas assistiram àquela e a outras demonstrações.
(...) Um ano antes de Santos Dumont exibir-se com o 14-BIS, voar já era uma rotina para os Wright. Depois de voos espetaculares de 1905, eles resolveram encerrar a fase de testes. Dedicaram-se a vender a ideia e ganhar dinheiro com ela. No dia 19 de outubro de 1905, escreveram para o departamento de Guerra dos EUA já com um toque de arrogância:
“Não pensamos em pedir ajuda financeira do governo. Nós pretendemos vender os resultados dos experimentos feitos com nosso próprio dinheiro.”
Também pediram detalhes do negócio:
“Não podemos fixar um preço nem um prazo de entrega, até ter uma ideia das qualificações necessárias para a máquina. Também precisamos saber se vocês desejam reservar o monopólio de uso dessa invenção, ou se permitirão que aceitemos pedidos de máquinas similares para outros governos, e para dar demonstrações públicas, etc”.
(...) Em maio de 1906, os dois obtiveram o registro de patente número 821.393, referente a controles de uma máquina de voar. A patente contem esboços detalhados do Flyer I, detalhando dimensões e o funcionamento dos mecanismos de aerodinâmica e controle, possibilitando máquinas voarem para os lados, para cima e para baixo. (...) A patente foi requerida três anos antes, ou seja, em 1903. Demorou para ser aprovada, mas, saiu seis meses antes de Santos Dumont ganhar prêmios com o 14-BIS.

O 14-BIS não voava: dava pulinhos


(...) Foi em 12 de dezembro de 1906. No campo de Bagatelle, diante de uma multidão, ele ligou o motor improvisado de um automóvel e percorreu, dentro do cesto, do 14-BIS, 220 metros, chegando a uma altura máxima de 6 metros. Sem saber que os americanos já tinham voado muito mais nos anos anteriores, os jornais franceses estamparam Santos Dumont como o grande pioneiro aéreo. O brasileiro, porém, não ganhou os 50 mil francos do Grande Prêmio da Aviação, já que percorreu menos de um quilômetro. Levou dois prêmios muito menores: 1500 francos do prêmio do Aeroclube, destinado a quem voasse mais de 100 metros (...) e 3 mil francos oferecidos por Ernest Archdeacon para quem voasse mais de 25 metros.
O herói brasileiro só voaria de novo com o 14-BIS em abril de 1907. Depois de um voo de 30 metros de distância, a máquina se desequilibrou bruscamente e bateu no chão.
O projeto foi abandonado. Seu “pato”, como era chamado pelos franceses, deixaria um legado pequeno. Nem Santos Dumont nem nenhum outro aviador levariam para frente a ideia de um avião formado com asas em forma de caixa e uma cesta de balão para levar o piloto.

Os franceses esqueceram Santos Dumont quando conheceram os Wright


Flyer III

Em maio de 1907, o secretário de defesa dos EUA escreveu aos Wright pedindo que apresentassem uma proposta de venda em série de aviões e instruções de voo.(...) No ano seguinte, finalmente convenceriam os europeus.
A Compagnie Générale de Navigation Aérienne, da França, tinha se interessado em comprar a patente e fabricar aviões – não, não os de Santos Dumont, mas o dos irmãos Wright. Para fechar o contrato, era preciso uma demonstração. Ela aconteceu em 8 de agosto de 1908, em Le Man, a 30 km de Paris. Wilbur Wright deixou os franceses estupefatos com seus longos, altos e ininterruptos voos em forma de oito. “O senhor Wright tem todos nós em suas mãos”, disse, depois dos testes, Louis Blériot, amigo de Santos Dumont e aviador que no ano seguinte seria o primeiro aviador a cruzar o Canal da Mancha.
(...) Os irmãos usavam mesmo uma catapulta e trilhos para impulsionar o Flyer. O mecanismo simplificava a decolagem.(...) Em 1908, durante as demonstrações da França, os técnicos que observavam o voo de Wilbur Wright questionavam o invento porque ele usava força exterior para decolagem. O americano sequer discutiu. Resolveu decolar sem os trilhos e a catapulta. Voou e quebrou recordes do mesmo modo.
(...) Em todo o mundo (com exceção do Brasil), a polêmica sobre o pioneirismo do avião acabou ali. Em 1908, os Wright mostraram que a criação de aviões tinha ultrapassado a fase de testes e façanhas extraordinárias. O avião já era uma realidade, bastava apenas alcançar a produção industrial

SANTOS DUMONT NÃO ERA PACIFISTA.

Ao contrário do mito que afirma que Santos Dumont ficou muito triste depois de ouvir um bombardeio aéreo ocorrido perto de seu hotel em Guarujá, em 1932, Santos Dumont sabia da utilidade militar dos elemntos aéreos e a promovia. Numa carta enviada aos jornais americanos em 1904, ele próprio afirma: “a França adotou meus planos de balões militares e pretende aproveitá-los na próxima guerra”, e que o Japão solicitava seus balões para uso militar, o que incluía “jogar explosivos de alta potência em Port Arthur”*
*Isso aconteceu em 1905, na Guerra a Rússia e o Japão, no Pacífico (nota minha, Murilo)

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